Após sua jornada cativante pela Índia, de Kanyakumari ao Himalaia, em apoio aos rios da Índia, Sadhguru dedica um momento para responder a algumas perguntas comuns do down2earth, sobre como a recomendação política, uma vez implementada, beneficiará esses cursos de água em crise. Ele fala sobre as possibilidades e armadilhas da ligação de rios, bem como os condicionamentos necessários de terra e de árvores para aumentar o fluxo de água dos rios.

P: Quais são seus pontos de vista sobre a interligação dos rios? Vai ajudar na sobrevivência dos rios e responderá à necessidade de água para todos?

Sadhguru: A iniciativa "Rally for Rivers" trata de revitalizar rios e aumentar seus fluxos de água. Esse foco em aumentar o suprimento de água é, portanto, qualitativamente diferente de outras medidas, incluindo a ligação de rios, que busca utilizar o suprimento de água atualmente disponível.

Alguns projetos de interligação já foram lançados. Seria ideal avaliarmos os ganhos econômicos desses projetos e compará-los com a perda de capital dos recursos naturais, antes de iniciarmos novos projetos.

Resposta específica à interligação de rios (da nossa Revitalização dos Rios na Índia, Projeto de Recomendação Política):

De nossa interação com alguns cientistas da ATREE, soubemos que o paradigma das bacias “excedentes” e “deficitárias” é, por si só, um entendimento limitado. Não leva em consideração as condições climáticas variáveis pelas quais estamos passando. Em muitas partes da Índia, mudanças complexas no regime das monções estão acontecendo e espera-se que essas regiões sofram ainda mais mudanças nos regimes de chuvas nas próximas décadas, devido a efeitos complexos do aquecimento da atmosfera e dos oceanos, ao impactos vindo do uso de aerossóis e da mudanças na cobertura do solo. Observa-se que as monções se enfraqueceram, desde a década de 1950, em regiões como os Ghats Ocidentais e em partes do centro e norte da Índia. Além disso, a distribuição temporal e espacial das chuvas se tornou mais variável. As chuvas, em algumas partes do país, estão ocorrendo agora por menos dias e, frequentemente, em períodos muito intensos. As bacias de “excedentes” podem, de fato, enfrentar um severo estresse hídrico devido a mudanças na natureza das chuvas.

Alguns projetos de interligação já foram lançados. Seria ideal avaliarmos os ganhos econômicos desses projetos e compará-los com a perda de capital dos recursos naturais, antes de iniciarmos novos projetos. Qualquer proposta para fazê-lo deve ser rigorosamente avaliada, com base no mérito científico e ambiental, e na sustentabilidade a longo prazo, e não com base em emoções e políticas. E, ao avaliar os benefícios em potencial, no contexto de nosso clima tropical, devemos levar em conta a perda de água resultante por evaporação e infiltração no solo. Na Índia, os rios são principalmente alimentados por florestas; portanto, trazer de volta a cobertura de árvores em ambos os lados do rio é a única solução sustentável, a longo prazo, para combater a escassez de água e reduzir o impacto de inundações e secas.

P: Quanta terra no total é necessária para a plantação nas margens dos rios? De quem será essa terra e como será adquirida?

Sadhguru: Todos os principais rios do país correm, em seu total, por cerca de 20,000 quilômetros - o que significa 40,000 km² de terra nas margens do rio (1 km em ambos os lados do rio). Cerca de 25% dessa terra pertence ao governo (exceto em alguns estados do Himalaia) e devem se tornar floresta (não há dados sobre a propriedade da terra às margens do rio; isso é uma aproximação da menção superficial de um governo estadual sobre a propriedade da terra). Isso precisa ser reflorestado com espécies de árvores nativas e endêmicas. As terras do governo, no lado do rio, podem ser reflorestadas por distância lateral maiores que 1 km, e até mesmo toda a terra do governo pode ser convertida em floresta. Quando dizemos árvores nativas e endêmicas, queremos dizer aquelas espécies específicas do ecossistema, seja de terras florestais antigas, de áreas úmidas ou de pastagens. Isso pode ser feito rapidamente, pois não envolve muitas partes interessadas. Essa intervenção, por si só, tem o potencial de exibir a mudança no microclima e a estabilização da precipitação.

Das terras agrícolas restantes, cerca de 10% são terras de delta que podemos deixar como estão. Então, 65%, ou cerca de 26,000 km², são as terras dos agricultores, onde queremos que eles mudem de culturas regulares para a agricultura baseada em árvores. Não há necessidade de adquirir terras para a solução proposta. Nós apenas queremos que os agricultores mudem da agricultura regular para a agricultura baseada em árvores. De nossa experiência, em pequena escala, temos observado que, quando um agricultor faz a transição de uma plantação baseada no campo para uma agricultura baseada em árvores, sua renda se multiplica. Nossa proposta política, portanto, não recomenda nenhuma aquisição de terras privadas. O estabelecimento de módulos de grande escala, com significância econômica, é a única maneira de despertar o entusiasmo na comunidade agrícola.

P: Os padrões de precipitação de chuva no país mudaram ao longo dos anos. Não temos chuvas moderadas, que são substituídas por chuvas extremas. Como, sob esse novo desenvolvimento, você acha que a plantação ajudará na recarga da água? Você tem algum estudo científico para apoiar sua afirmação?
 
Sadhguru: A relação entre árvores e chuvas é reconhecida cientificamente. Em nossa cultura, esse reconhecimento é seguido ritualisticamente pela criação de bosques sagrados. Esses bosques sagrados nada mais eram do que compósitos do número limite de árvores que semeiam chuva. Especialmente em um estado de sotavento como Tamil Nadu, onde recebemos chuvas de monções em recuo, essa foi a única maneira de chover nas áreas do interior. Nossa recomendação política foi baseada em uma extensa revisão da literatura científica e no envolvimento de especialistas que abrangem toda a gama de disciplinas científicas relacionadas, incluindo especialistas em florestas, especialistas em hidrologia e cientistas da Universidade Agrícola de Tamil Nadu. Existe um forte consenso de que o reflorestamento estabilizará os microclimas e padrões de precipitação em uma determinada região, levará a uma melhor retenção de água da chuva no solo e recarga das águas subterrâneas, o que levará a chuvas mais estáveis devido à capacidade de semeadura das árvores por evapotranspiração das folhas (o processo pelo qual a água é transferida da terra para a atmosfera pela evaporação do solo, e de outras superfícies, e pela transpiração das plantas) e por outros materiais de propagação da chuva (como os pólens) que eles emitem. Detalhes da base científica podem ser encontrados no Livro de Recomendação Política Preliminar.

P: Qual a sua opinião sobre o compartilhamento de água entre os estados ribeirinhos superiores e inferiores?

Sadhguru: No momento, não há água suficiente fluindo em um rio. Até rios perenes deixaram de fluir o ano todo. Não precisamos lhe dizer, mas ainda assim, o fluxo em Kaveri e Krishna caiu 40%, e Krishna não encontra o mar por cerca de 3-4 meses em um ano. Diante desse cenário, é provável que os estados ribeirinhos superiores e inferiores vão lutar pela água. Por exemplo, agora há uma briga pelo River Kaveri entre Karnataka, o estado ribeirinho superior, e Tamil Nadu, o estado inferior. Não estou em nenhum dos lados da luta, porque nasci e cresci em Karnataka, mas agora estou em Tamil Nadu. Estou deixando bem claro que estou do lado do Kaveri - não do lado de nenhum dos estados. Precisamos estar do lado do rio. Por milhares de anos, Kaveri fluiu e não houve conflito. Somente agora que o fluxo do rio está se esgotando é que a luta começou. Portanto, precisamos revitalizar os rios e aumentar a fonte para ampliar o fluxo da água, para que os estados ribeirinhos superior e inferior se beneficiem. Todo o trabalho que estamos propondo para a revitalização dos rios é para aumentar a fonte do rio. Devemos romper com o mito de que apenas a parte superior e a origem do rio fazem a captação dos rios. Cada centímetro de terra neste planeta é uma captação de algum rio. Então, estamos propondo plantar árvores em pelo menos 1 km em ambos os lados dos rios para primeiro convencer os agricultores. Se os agricultores enxergarem, através do exemplo, a economia da transição da agricultura baseada no campo para o cultivo baseado em árvores, eles não pararão e o plantio se expandirá além da recomendação mínima de 1 km. Quando isso acontecer, os rios fluirão e as razões para quaisquer disputas de água entre as margens superiores ou inferiores também cairão.

Nota do editor: Um trecho deste artigo foi publicado originalmente no down2earth, em 10 de Outubro de 2017.

Saiba mais sobre como você pode apoiar o Rally for Rivers em rallyforrivers.org